Lembro dos meus aniversários, aquele bolo de glacê azul. Aquele povão dando tapa na minha cabeça e dizendo que eu cresci...
Não sei por que colocávamos os presentes sobre a cama. Aquele monte de meias Lupo, ontem abri um par daquela época.
Meu tio Arnaldo, sempre querendo estimular nossa culpa, ia de chinelo Havaiana, com uma tira de cada cor, camiseta regata e a bermuda de coqueiros. Sempre com aquela frase ensaiada:
_O presente eu mando depois...
Meu tio Lindomar, sempre com presentes inúteis, aquelas agendas, canecos de louça, uma vez ele me deu uma camiseta de um posto de gasolina.
O pior de todos, foi um em que minha Tia Cotinha veio doente ficar na nossa casa, a casa cheia e a minha tia lá, sentada, totalmente esclerosada, xingando palavrões.
Tio Nescésio, orgulhoso do seu problema de próstata, cantando aos quatro cantos que seu mal é fruto de doença venérea mal curada. Sofre de incontinência urinária, usa fraldão e sua cadeira também especial, é forrada com um impermeabilizante importado ,Protect All, comprado no 09001. Ano passado tentaram curá-lo, o velho ficou enterrado por 12 horas na praia da areia preta em Guarapari, as areias monazíticas possuem propriedades medicinais tidas como milagrosas, mas de nada adiantou. Adora contar aos mais novos as suas proezas sexuais, como no dia em que numa noite só, transou com uma tailandeza praticante de pompoarismo que abria uma garrafa de champanhe de um modo nada convencional, com uma francesa que trabalhava num circo como engolidora de fogo que o chamava de “Mon Cheval!” “Meu cavalo!”, e uma padeira portuguesa que fazia amor cantando o “Vira”. “Bons tempos aqueles!” Repete ele com os olhinhos verdes molhados, toda vez que conta essa história.
Tio Claudionor, o impotente, com aquela cara de cantor de tango. Casado com minha Tia Helma, queimando as crianças com a ponta do cigarro.
Sei que no meio da festa minha mãe resolve mostrar as jóias da minha tia Cotinha à uma amiga e descobre que as mesmas foram roubadas.
Para variar acusaram o meu tio Arnaldo, coitado, só porque estava desempregado...bom deixa porque até eu que era pequeno puxei o corinho:
_Foi tio Arnaldo, foi tio Arnaldo!
O clima ficou péssimo na nossa casa. E pioraria. Numa manhã, minha mãe colocava roupas no varal quando Adelaide, nossa empregada, passou enrolada numa toalha saindo do banho em direção ao seu quarto. Minha mãe olhou e soltou um grito:
_É a meia! Eu conheço essa meia!
Adelaide trazia os cabelos enrolados e presos numa meia , coisa que mulher faz de vez em quando, principalmente as auxiliares do lar.
_É a meia das jóias.
Acontece que como a caixa que guardava as jóias de tia Cotinha estava muito velha, cheia de buracos, minha mãe pegou a caixa e colocou numa meia dessas finas de mulher. E era justamente essa meia que Adelaide trazia prendendo os cabelos. Em minutos todos estavam ali fora, minha mãe pegou Adelaide foi pro quarto dela e trancou a porta. Ficaram ali conversando por duas horas. Quando enfim a porta se abriu...
Lá dentro do quarto ela confessou o crime, em troca de não denunciá-la para a polícia. Adelaide devolveria as jóias e abdicaria de todos seus direitos trabalhistas.